fazedoras

de cocada

 

        Nesta primeira coleção, apresentamos as fotografias como representações das coisas. Portanto, as fotos não são meramente registros da feitura da cocada, mas uma forma de demonstrar as linhas traçadas pelos gestos das mãos destas mulheres. Os passos seguidos, através delas, nos deram a compreensão de como estes gestos são inspirados pelo mundo ao redor. Aqui, apresentamos as três gerações de mulheres: a mãe, D. Maria (70 anos, não alfabetizada); a filha, D. Mirian (48 anos, ensino fundamental) e a neta, Karine (22 anos, ensino médio completo). Para Gildevan Dias, contamos com a seguinte narrativa sobre a sua comunidade:

        Bibiana, personagem do livro “Torto Arado”, narra parte do seu trabalho com a colheita e venda de buritis nas feiras como uma maneira de contribuir para a renda familiar. De forma análoga à obra de Itamar Vieira Junior, na qual tal trabalho é dirigido majoritariamente por mulheres, há na comunidade de Coqueiro de Monte Gordo, Camaçari-BA, a forte ligação com a produção de cocadas artesanais, uma fonte financeira que norteia as famílias economicamente menos favorecidas daquele entorno. Mesmo sem incentivos governamentais ou municipais que possam viabilizar melhores estruturas de produção, distribuição e venda, e consequentemente, impactar positivamente na valorização da cultura local.

        Por ser uma comunidade rural e sem tanta infraestrutura, parte das atividades econômicas de Coqueiro de Monte Gordo é representada pela venda de frutas e hortaliças na feira do distrito, ou pelas cocadas comercializadas individualmente pelas famílias nas praias da região. Mas, antes mesmo da chegada nas áreas litorâneas, desenvolvem-se processos como a compra do coco e materiais, corte, descasque, cozimento e embalagem. E, consequentemente, todo este ciclo de produção artesanal se soma ao trabalho de venda ambulante, que é realizado nas praias.

        Apesar de sua difusão como produto na comunidade coqueirense, percebe-se também que a cocada não é garantia de uma renda estável e valorizada no distrito de Monte Gordo. Isso porque, segundo relatos de Mirian Alves Dias, no documentário “Cocada Bahia”, de Fernanda Serafim, fora do período de verão é quase impossível vender todos os doces da bandeja. Ou até mesmo ir todos os dias para a praia, já que o fluxo de clientes se reduz consideravelmente na ausência das estações de pico e feriados movimentados. Sendo assim, a produção desse doce é um meio de sobrevivência difundido localmente, mas inseguro e difícil.

         Ainda há um grande percurso para que tal mercadoria possa ser uma fonte de renda menos instável. Mas tanto o mapeamento das fazedoras e fazedores de doces, quanto da implementação de um modelo cooperativista parecem ser caminhos para o melhor desenvolvimento da comunidade, pois através de uma estrutura mais solidária, junto ao aperfeiçoamento do coco como produto, é possível construir a sustentabilidade econômica e valorização cultural da cocada, de forma similar por exemplo, à Coopercuc em Uauá-BA, ao elevar a importância do umbu localmente e mundo afora.

galeria

OBS: Todas as imagens disponibilizadas nesta galeria possuem autorizações para veiculação.

Seção I - Inventar o aparato a lenha para cozinhar

O conceito de cacete armado revela-se no saber-fazer com criatividade e improviso que se realiza na precariedade do nosso cotidiano; o aparato a lenha é o ato.

Seção II - Buscar e catar o coco no solo

Para a feitura da cocada, as mulheres, originalmente, iam buscar em seus sítios ou fazendas vizinhas os frutos, chamados coco. Elas caminhavam para catar no solo o fruto caído, usavam o facão para catá-lo.

Seção III - Identificar a condição e selecionar o coco

Para verificar se o coco serve como alimento, elas o sacodem com bastante sutileza e escutam o barulho da água; o tipo de barulho que ecoa do interior do fruto define o estado. Esta técnica ainda é fartamente usada, mesmo quando os compram em supermercados ou em feiras.

Seção IV - Quebrar e descascar

O facão é uma ferramenta usada com bastante destreza para abrir os cocos, um por um, com muita paciência e destreza e, no movimento, elas não demostram insegurança em pegá-lo e segurá-lo numa mão e parti-lo com a outra. Assim, os cocos são quebrados, com suas cascas duras, uma vez que se trata de cocos maduros. A outra ferramenta usada por elas é uma faca amolada, mas também pode ser o facão. Elas conduzem a faca ou o facão no casco do coco, para retirarem a polpa do fruto.

Seção V - Cortar e ralar a polpa

Temos o conjunto de polpa com as suas cascas. As cascas são devidamente retiradas, agora com o uso da faca amolada. Com isto, logo teremos as polpas sem as cascas. Os cortes feitos na polpa, pelas mulheres, são diversificados porque é também pelo corte que se identifica a diversidade do tipo de cocada existente, não somente pelo uso dos ingredientes, como no diz D. Maria: – “Sim, aí comecei a fazer a cocada de coco, cortei o coco, pinicava, ralava e fazia a cocada.”

Seção VI - Preparar para levar ao fogo

Na juntada com os ingredientes, o açúcar é o básico, posto que a cocada é uma iguaria doce e, em sua primeira edição, a cocada só levava o açúcar e a água misturados, gradativamente.

Seção VII - Cozinhar a cocada

No preparo no fogo há os movimentos de mexer a polpa, o que conduz à diversidade de texturas; já os sabores e cores da cocada se diversificam por inclusão de novos ingredientes, e a cor também tem a ver com o tempo de duração da quentura ao fogo.

Seção VIII - Diversificar o sabor, a cor e a textura

Para diversificar: “A gente deixa no ponto que a gente quer ela. Quando queremos quebra queixo, deixa molinha, deixa mais ressecado, deixa do jeito que quiser … É, coco queimado e amendoim, depois daí pronto, a cocada tem abacaxi, goiaba, amendoim, maracujá, leite condensado, banana, cacau, goiaba, hoje faz do que quiser.
– Castanha, é, licuri, hoje faz de qualquer coisa a cocada, se quiser fazer, jenipapo, jenipapo é uma boa, viu?”

Seção IX - Arrumar a mesa para receber a cocada

Tem-se um pedaço retangular da tábua posto num suporte, depois envolve a tábua num plástico reciclável, daí cria-se a mesa, cuja função é recepcionar e modelar as cocadas.

Seção X - Modelar a cocada

E modelam com uma colher de pau, de acordo com o tamanho que se deseja.

Seção XI - Embalar a cocada

Por fim, embalam o doce para ser vendido, com maior frequência nas praias da orla de Camaçari; por vezes, ocupam outras cidades próximas, tais como Salvador e Mata de São João.